segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013


AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE CORPOREIDADE AO S DIFERENTES CONCEPÇÕES DE CORPOREIDADE AO 
LONGO DA HISTÓRIA ONGO DA HISTÓRIA

A professora que desenvolve sua docência com crianças tem o 
privilégio de vivenciar um momento singular de sua carreira profissional: 
o contato com o cotidiano do universo infantil, o início do processo de 
desenvolvimento educacional. E esse momento pode ser muito marcante 
para ambas as partes quando as atividades lúdico-corporais se encontram 
presentes. Ao desenvolver sua ação docente, tendo como foco tais atividades 
permeando o contexto educacional infantil, pela riqueza de possibilidades 
que podem propiciar às crianças, é possível uma ampliação dessas 
possibilidades tendente a estimular suas potencialidades corporais nas 
diversas manifestações.
Tal professora, quando se envolve de forma efetiva com as 
crianças, tem a oportunidade de se construir profissionalmente nessa área 
e desenvolver um olhar conceitual mais consistente, podendo contribuir 
muito para que as crianças possam atingir níveis mais ampliados de 
suas potencialidades nos aspectos afetivo, motor, cognitivo e social. Isso 
principalmente quando tem como base conteúdos contextualizados que 
estejam relacionados com as necessidades emergentes no âmbito do 
processo educacional das crianças ou mesmo das etapas singulares que 
caracterizam infância em seu todo.
As atividades lúdico-corporais no contexto da educação infantil, no 
entanto, não têm tido real valor, de um lado das instituições escolares, de 
outro de uma parte considerável de professoras. Estas muitas vezes, não as 
desenvolvem com os objetivos claros a serem trabalhados com as crianças, 
de forma a conduzi-las a desenvolver suas potencialidades num contexto 
mais amplo, possibilitando-lhes ampliar suas capacidades cognitivas, afetivas, 
sociais e motoras. 
Nessa perspectiva, quando tais atividades pedagógicas não são 
incorporadas no contexto escolar revelam, por parte da professora, um 
envolvimento menor com relação às características inerentes do processo 
educacional das crianças, privando, com isso, tanto as crianças quanto 
a professora de atuar dentro do contexto maior e rico em possibilidades 
educativas.
Esse aspecto deve ser devidamente considerado, até porque pode 
caracterizar despreparo profissional, tendo em vista que, historicamente, a 
educação infantil não tem sido devidamente valorizada no que se refere às 
características inerentes às crianças dessa faixa etária da população escolar. 
Estas necessitam de profissionais com formação rigorosa e contínua, tanto 
no que tange ao aprofundamento conceitual, quanto aos debates atuais que 
versam a respeito do processo educacional na perspectiva da infância, tendo 
como base as atividades lúdico-corporais no âmbito escolar. 
Considerando não somente o discurso legal, mas por entender de 
fundamental importância o fomento e a implementação das atividades lúdicocorporais, sob a forma de jogos, brinquedos e brincadeiras na educação de 
crianças, é que nos propomos refletir a respeito de sua importância em sua 
formação geral. Tal reflexão terá como foco de atenção algumas concepções 
historicamente dominantes e que, de certa forma, têm interferido, no decorrer 
da história, em todo o processo educacional infantil.
Importa ressaltar que os jogos, os brinquedos e as brincadeiras devem 
ser assumidos, nas escolas de educação infantil, como mais um componente 
curricular rico de possibilidades educativas. Para tal, torna-se necessário 
que sejam desenvolvidos em todas as suas dimensões e com qualidade 
à totalidade das crianças matriculadas na escola, visto que esta área do 
conhecimento é imprescindível à sua formação. Não bastasse, é que a 
escola, em seu conjunto, preserve o direito de as crianças serem respeitadas 
em seu contexto infantil, até porque os jogos, os brinquedos e as brincadeiras 
oferecem muitas alternativas de atividades que se encontram dentro do 
contexto da realidade lúdica, característica marcante na vida das crianças. 
A Constituição do nosso país, por meio do artigo 205, estabelece 
de forma bem clara: A educação, direito de todos e dever do Estado e da 
família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, 
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício 
da cidadania e sua qualificação para o trabalho. 
Portanto, as atividades lúdicas podem contribuir em muito para que a 
escola se torne, cada vez mais, espaço de alegria, de soltura, de felicidade e 
de descoberta constante das potencialidades corporais, afetivas, cognitivas e 
sociais das crianças. 
Por isso, a escola 
[...] já contém elementos válidos de alegria. Ela não é oposta à alegria, 
esse sentimento já é possível na escola atual, o que torna ainda 
mais lamentável que ela não esteja entre seus objetivos primordiais. 
É a partir da própria escola, dos fragmentos felizes que ela deixa 
transparecer, que se pode começar a pensar em como superar a escola 
atual. (SNYDERS: 1993, p. 12)
Nessa perspectiva, entendemos que a escola não deve se opor 
ao desenvolvimento de tal sentimento, assim como a não – incorporação, 
por parte dela, de atividades que contenham elementos lúdicos a serem 
trabalhados com as crianças da educação infantil, pode ser considerada 
atitude eticamente incorreta, até porque, com sua não-utilização, deixase de propiciar-lhes momentos potencialmente alegres e ricos de aspectos 
estimuladores que possibilitem ampliar as potencialidades infantis.
Com isso, entendemos seja exatamente no decorrer do processo 
de formação que as crianças necessitam ter acesso ao conhecimento e ao 
domínio de suas relações através do corpo, imerso numa dimensão lúdica. 
São, até mesmo, as crianças, em sua totalidade, as que mais necessitam 
de estímulos para o aperfeiçoamento e domínio das suas possibilidades 
corporais, como aspectos basilares para que o desenvolvimento educacional 
seja construído de forma contextualizada e possa atender a suas 
necessidades singulares, oriundas da fase de desenvolvimento em que se 
encontram.
Vygotsky (1989), ao refletir a respeito do sentimento de satisfação 
que muitas professoras acreditam predominar nos jogos, aponta para o fato 
de que, apesar de estar presente em todo o contexto das atividades lúdicocorporais, o prazer e outros sentimentos que ressaltem a satisfação por parte 
das crianças, ao participar dos jogos, dos brinquedos e das brincadeiras 
infantis caminham sempre lado a lado com seus opostos. O autor alerta 
para o fato do desprazer ser um dos componentes existente no universo 
lúdico, principalmente quando são desenvolvidas atividades que apresentam 
como características predominantes a vitória de uns sobre os demais. Nessa 
perspectiva, o autor ressalta:
Definir o brinquedo como uma atividade que dá prazer à criança é 
incorreto por duas razões. Primeiro, muitas atividades dão à criança 
experiências de prazer muito mais intensas do que o brinquedo, como 
por exemplo, chupar chupeta, mesmo que a criança não se sacie. E, 
segundo, existem jogos nos quais a própria atividade não é agradável, 
como por exemplo predominantemente no fim da idade pré-escolar, 
jogos que só dão prazer à criança se ela considera o resultado 
interessante. Os jogos esportivos (não somente os esportes atléticos, 
mas também outros jogos que podem ser ganhos ou perdidos) são, com 
muita freqüência, acompanhados de desprazer, quando o resultado é 
desfavorável para a criança. (VYGOTSKY: 1989, p. 106).
Portanto, a mudança do comportamento infantil ocorrerá, de forma 
preponderante, no início da idade pré-escolar, com o surgimento dos 
desejos que não podem ser atendidos de forma imediata. Numa tentativa 
de solucionar essa questão, Vygotsky esclarece que a criança tende a se 
envolver em suas fantasias quando seus desejos não realizáveis podem vir a 
ser, ao menos de forma ilusória, realizados, mundo esse que o autor chama 
de brinquedo. 
Nesse sentido, importa ressaltar:
A imaginação é um processo psicológico novo para a criança; 
representa uma forma especificamente humana de atividade consciente, 
não está presente na consciência de crianças muito pequenas e está 
totalmente ausente em animais. Como todas as funções da consciência, 
ela surge originalmente da ação. O velho adágio de que o brincar da 
criança é imaginação em ação deve ser invertido; podemos dizer que 
a imaginação, nos adolescentes e nas crianças em idade pré-escolar, é 
o brinquedo em ação. (VYGOTSKY: 1989, p. 106) 
Em concordância com o autor, entendemos que as atividades lúdico corporais devem ser desenvolvidas nas escolas de educação infantil. Mais: 
necessitam ser trabalhadas no sentido de propiciar às crianças condições 
para que possam se relacionar entre si, com a sociedade em seu todo e com 
os objetos que as circundam, por meio de atividades que as levem a adquirir 
e a aprofundar a consciência do próprio corpo, o aperfeiçoamento dos 
movimentos, a estimulação dos sentidos, assim como o domínio das relações 
espaciais.
Portanto, as crianças necessitam desenvolver e aperfeiçoar as mais 
variadas formas de movimentação de seu corpo no espaço, motivo pelo 
qual é importante que estejam presentes, em todo o processo educacional, 
as atividades corporais que possam conduzi-las a adquirir o domínio e o 
controle do próprio corpo. Assim, elas poderão atingir uma auto-expressão 
cada vez mais aprimorada, motivo por que os jogos, os brinquedos e as 
brincadeiras deverão estar direcionados para a estimulação de todo o 
potencial corporal e do espírito de coletividade, tendo sempre em vista 
o aumento do nível de participação no grupo, assim como devem ser 
oferecidas atividades que facultem às crianças a superação de possíveis 
defasagens, muitas vezes oriundas de ambientes pobres em estímulos dessa 
ordem. 
Outro elemento a ser destacado é que devem, também, ser ampliadas 
as oportunidades para que as crianças tenham as formações conceituais por 
meio do aumento do potencial exploratório do ambiente, dos objetos e da 
diversificação das situações de aprendizagem.
Nessa perspectiva, alguns aspectos merecem atenção por parte 
das professoras, tendo em vista que aquelas são repletos de elementos 
de importância fundamental no desenvolvimento de suas capacidades e 
habilidades corporais, quais sejam:
• conhecimento das diversas partes do corpo e suas possibilidades na 
construção da consciência corporal;
• noções de direção (direita, esquerda) e dominância lateral;
• andar, correr, saltar, trepar, engatinhar, quadrupedar, levantar, 
carregar, transportar, com as mais diversas variações rítmicas;
• equilíbrio estático e dinâmico de forma individual e em grupos, com 
material de apoio ou sem ele;
• coordenação motora: dos membros superiores e inferiores, visomanual e manipulatória, entre outras;
• orientação espacial: longe, perto, alto, baixo, frente, atrás, dentro, 
fora;
• relaxamentos;
• desenvolvimento rítmico com a utilização de jogos cantados;
• memória;
• afetividade e fortalecimento da formação de grupos, entre outras.
Ao desenvolver atividades que tenham como característica 
predominante a movimentação corporal, é necessário que as professoras 
tenham algumas precauções para propiciar às crianças maior segurança, 
tendo em vista que estas ficam mais expostas a machucaduras. Isso pode 
causar desconforto para pais, mães e responsáveis que, em princípio, 
acreditam que a escola é local seguro para seus filhos. Para isso, torna-se 
necessário que as professoras procurem estar atentas para situações que 
possam causar acidentes (obstáculos, movimentações grupais e atividades em 
áreas externas da instituição de educação infantil). 
Dessa forma, importa salientar que o conteúdo desenvolvido 
na perspectiva dos jogos, dos brinquedos e das brincadeiras a serem 
vivenciados pelas crianças que freqüentam as escolas de educação infantil 
necessita ser devidamente adaptados, tendo em vista as condições materiais 
disponíveis nas escolas. 
A professora deve estar atenta em relação à importância de serem 
feitas as devidas adequações das atividades lúdicas a serem trabalhadas 
com as crianças, tendo em vista as necessidades e características oriundas 
da faixa etária. Bem assim deve ser observada a forma como poderão ser 
desenvolvidos tal conteúdo e o nível de dificuldade exigido em cada aspecto, 
de modo que sua auto-estima seja sempre estimulada para melhor, por parte 
dos professores responsáveis pela condução das atividades pedagógicas.
Importa considerar a atenção a ser dada com vista a ser evitada a 
oferta de atividades que concentrem em demasia elementos competitivos, 
em que as crianças sejam expostas a situações que, para terem sucesso, 
necessitam sobrepujar os outros, até porque, quanto menor a faixa etária 
a ser trabalhada, maior será a dificuldade de as crianças conviverem 
emocionalmente com os fracassos oriundos das atividades lúdico-corporais 
que as exponham a situações constrangedoras, uma das características 
presentes e oriundas das atividades competitivas.
1.1 - Das concepções .1 - Das concepções
Muitas questões surgem quando se pensa sobre as concepções que, 
historicamente, têm acompanhado o desenvolvimento da corporeidade 
infantil, principalmente no que se refere ao direito de acesso à cultura 
corporal por parte das crianças.
Apesar de não ser exclusividade das professoras de Educação 
Física, têm sido essas, as profissionais que têm atuado no âmbito escolar, 
por serem as responsáveis de forma mais direta pelo desenvolvimento das 
atividades lúdico-corporais das crianças. É necessário ressaltar que os jogos, 
os brinquedos e as brincadeiras podem e devem ser trabalhadas pelas 
demais professoras, mesmo porque a utilização de conteúdo voltados para 
o desenvolvimento dos aspectos lúdicos corporais das crianças está presente 
nos currículos dos cursos de graduação em Pedagogia, com disciplinas 
voltadas para este fim. 
Dessa forma, ao discutirmos as concepções pedagógicas em 
Educação Física, estaremos levando em consideração o fato de que, 
no decorrer do processo educacional brasileiro, a Educação Física, na 
qualidade de disciplina constante nos currículos escolares, foi e continua 
sendo influenciada por concepções que necessitam passar por um processo 
efetivo de superação. Assim, as concepções que têm se apresentado de 
forma conservadora serão devidamente analisadas no decorrer do texto, 
visando à possibilidade de contribuir para que sejam devidamente superadas. 
Mais: que possamos construir novas formas de atuação das professoras numa 
perspectiva de ampliação do nível de participação de todas as crianças que, 
porventura, estiverem sendo trabalhados numa perspectiva lúdico-corporal. 
Com freqüência, por esta realidade, são levantadas questões de como 
o domínio das concepções pedagógicas em Educação Física poderá vir a 
ajudar as professoras que desenvolvem a docência, tendo como base as 
práticas corporais e o desenvolvimento de formas de trabalho que contribuam 
para que elas possam dar aulas de boa qualidade, mesmo diante da enorme 
carência de material que possibilitem sua prática. E, por igual, de que forma 
estes conhecimentos poderão vir a auxiliá-las a concretizar seus sonhos de 
se tornarem boas profissionais, pois, tais professoras, têm o dever de ensinar 
bem e estar preparadas ou, mesmo, preparando-se constantemente, inclusive, 
para a possibilidade de terem crianças com dificuldades corporais mais 
acentuadas e que, necessitam, com isso, de um trabalho que atenda suas 
necessidades educativas mais específicas.
A professora, ao trabalhar com a carência ou mesmo com a 
ausência de material didático, na proporção direta de seu envolvimento 
com as crianças e de um comprometimento profissional, tende a desenvolver 
mecanismos para produzir, com estas, os conhecimentos necessários 
inerentes à sua prática. Assim, dependendo de seu interesse e do 
envolvimento profissional, poderão ocorrer descobertas de outros aspectos 
que possibilitarão, em parte, o desenvolvimento do conteúdo inerente à sua 
disciplina e até a descoberta de novo conteúdo.
Ressaltamos que isso não exclui a importância da construção de novos 
espaços, por meio da criação de intercâmbios com seus colegas de outras 
disciplinas, no intuito de enriquecer seus conhecimentos nos mais variados 
aspectos do conhecimento humano, assim como de reivindicar às autoridades 
constituídas condições materiais e de trabalho dignos, para que possa estar 
contribuindo, de maneira mais eficiente e efetiva, com o desenvolvimento 
educacional das crianças sob sua responsabilidade. 
Percebe-se que as concepções pedagógicas em Educação Física têm 
influenciado a prática pedagógica e política desta categoria de profissionais 
em seu processo de desenvolvimento histórico. Essas professoras, por estarem 
profissional e afetivamente envolvidas com a educação de crianças em 
sua totalidade, necessitam ter uma visão clara dos aspectos excludentes 
que possam existir em determinadas concepções para que, nos limites de 
sua criticidade, possam detectá-los e, a seu tempo, trabalhar no intuito de 
contribuir para a superação dos mesmos.
A importância do domínio das concepções pedagógicas que perpassa 
o ensino da Educação Física brasileira se dá tendente à necessidade de 
ampliação dos espaços e possibilidades de desenvolvimento corporal, 
principalmente quando tais professoras se encontram envolvidas com crianças 
provenientes das classes populares que, em geral, freqüentam as escolas 
públicas e em sua maioria, encontram na escola uma das possibilidades 
de melhoria da qualidade de vida e, também, do desenvolvimento da 
cidadania.
Castellani (1991) anuncia a existência de algumas tendências 
básicas, identificáveis na Educação Física brasileira. Inicialmente o autor 
aponta para uma concepção que tem a característica de explicar e 
compreender de forma reduzida o homem em movimento limitado apenas 
a seu eu biológico, levando, com isto, a uma dissociação do que se possa 
considerar, antropologicamente falando, como aspectos que distinguem os 
movimentos dos homens em relação a outros animais. 
Para este autor, o reducionismo biológico se concretiza à medida que 
enfatiza, de forma exagerada, as questões que se referem à performance 
esportiva. Tais questões são correspondentes, na Educação Física, à ordem 
da produtividade, da eficiência e da eficácia, características que são relativas 
ao modelo de sociedade na qual a brasileira encontra identificação.
Os aspectos denunciantes desta tendência se mostram, também, na 
presença da categoria médica marcante em currículos formais e em conceitos 
com relação à saúde, distante do que a Organização Mundial da Saúde 
entende por Saúde Social: os homens têm acesso à alimentação, moradia, 
educação, trabalho e lazer em meio outros aspectos.
 Desta forma, Castellani (1991, p. 108) aponta: visto isoladamente, 
dissociado dos demais fatores de saúde, o exercício físico, antes mesmo de 
propiciar saúde, pressupõe a sua existência para ser praticado sem incorrer 
em prática danosa ao Homem. 
 Importa ressaltar que as academias médico-cirúrgicas e o ensino 
militar foram os primeiros cursos implementados no nosso país com a vinda 
de Dom João VI de Portugal, juntamente com a sua corte, forçados pelas 
tropas napoleônicas, nos primórdios do século XVIII, caracterizando com isso 
o poder de interferência desta categoria profissional.
Ghiraldelli (1991) tem contribuído para o desenvolvimento dos 
debates em relação às tendências da Educação Física brasileira, ao deixar 
claro que, apesar de estar inserida num contexto histórico-social maior, 
ela tem assimilado valores correspondentes ao pensamento hegemônico 
contemporâneo.
O autor afirma que a tendência higienista da Educação Física se 
originou do pressuposto de que ela vem a ser um dos agentes do saneamento 
público, difundindo a crença de que a atividade física tem o poder de livrar 
a sociedade dos vícios e doenças, responsabilizando assim a escola, pois 
esta era considerada “redentora da humanidade”, alijando-se as condições 
precárias em que vivia e vive a maior parte da população brasileira. Esta 
concepção de Educação Física não abria espaços para os alunos que 
apresentavam necessidades educacionais especiais, visto que, em sua grande 
maioria, sempre viveram isolados ou eram atendidos em instituições de cunho 
filantrópico e segregacionista. 
No início do século XIX, surge o “Método Sueco de Ginástica”, 
idealizado por Peer Henrich Ling (1776-1839), que representava avanço 
na época, tendo em vista o fato de ter sido o início da sistematização de 
atividades físicas. O principal objetivo deste método era, fundamentalmente, 
o desenvolvimento muscular. Tal método privilegiava, também, as flexões 
das partes do corpo, pequenas corridas, saltos e jogos. A aula, desenvolvida 
sob a denominação de sessão de ginástica, era rigorosamente dirigida pelo 
instrutor, que devia dominar a matéria ensinada e, ao mesmo tempo, servir de 
modelo ao aluno. (SOARES et al., 1992). 
 Como pano de fundo, tal método serviria para fortalecer a 
concepção dominante de assepsia social.
Ghiraldelli (1991) nos mostra que, apesar de ter sido difundida a 
partir de meados do século passado, tendo como protagonista o pensador 
liberal brasileiro Rui Barbosa, ainda permanecem traços denunciantes desta 
concepção, até porque, com a existência do fenômeno da proliferação das 
academias de ginástica, de musculação e de dança, ainda percebemos 
que se nutre, mesmo que minimamente, nessa crença, mais forte nas classes 
médias, da existência de uma real possibilidade de aquisição de saúde e 
beleza através da Educação Física. 
Em seguida, o autor enfatiza :
O cuidado com o corpo surge, então, desprendido das possibilidades 
(ou impossibilidades?) que cada indivíduo, inserido nesse sistema social, 
possui para adquirir e preservar a saúde e manter o padrão estéticocorporal imposto pela mídia. (GHIRALDELLI: 1991, p. 24). 
Observa-se, por esta tendência, que a preocupação com a saúde 
se restringe a uma determinada categoria social. Com isso, tornavam-se 
excluídas, também, as pessoas que possuíam nível mais acentuado de 
dificuldade, proveniente de algum tipo de deficiência, e, também quando 
não, por pertencerem, em sua grande maioria, às classes sociais de menor 
poder aquisitivo. 
A concepção militarista, eugênica, com traços nazi-fascistas, muito 
disseminada entre professoras e professores de Educação Física, embora 
mais atuante em outra época, ainda encontra adeptos. A própria forma de 
comunicação entre professora e alunas, as organizações em filas, coluna e a 
chamada “voz de comando” continuam sendo normalmente utilizadas. Esta 
concepção é difundida desde meados do século XIX, conforme nos mostra 
Soares:
Por volta de 1860, o método alemão é consagrado como o método 
oficial do exército brasileiro, sendo que, em 1870, o Ministro do 
Império determina a tradução e publicação do ‘Novo Guia para 
o Ensino de Ginástica nas Escolas Públicas da Prússia’. O método 
alemão permanece como oficial da Escola militar até o ano de 1912, 
quando então é substituído pelo método francês. (SOARES: 1994, p. 
70)
Tal método chega ao Brasil por volta da década de 40, com o 
professor Auguste Listello, e era denominado de Educação Física Desportiva 
Generalizada. Inicialmente difundido na França, tinha como proposta a 
normatização da Educação Física no âmbito escolar e tornou os esportes 
competitivos mais importantes do que outros componentes da cultura 
corporal, como a dança, as lutas e os jogos, entre outros.
Dessa forma,
O ensino do esporte na escola se dá, exclusivamente, a partir dos 
parâmetros fornecidos pela instituição desportiva, ou seja, a partir 
de suas normas e regras. Dá-se, portanto, nos limites que a técnica 
especifica de distintas modalidades esportivas exige. Se o método 
de Ling voltava-se para uma assepsia social, a Educação Física 
desportiva generalizada volta-se para um projeto de ordenamento e 
hierarquização social. (SOARES et al.,199, p. 216)
Outra tendência muito presente na Educação Física brasileira é 
a competitivista. Essa concepção está diretamente ligada aos valores 
hierárquicos e elitistas, tendo como parâmetros a competição e a superação 
individual. Cultua-se ao máximo o atleta-herói, ficando a Educação Física 
com uma característica de neutralidade política e um papel de subserviência 
diante do desporto de elite, intensificando-se trabalhos para aprimorar 
os conhecimentos a respeito do Treinamento Desportivo, com base na 
Biomecânica e na fisiologia do Esforço.
A Educação Física, filha do liberalismo e do positivismo, dele absorveu 
o gosto pelas leis, pelas normas, pela hierarquia, pela disciplina, pela 
organização da forma. Do liberalismo, forjou suas ‘regras’ para os 
esportes modernos (que, não por acaso, surgiram na Inglaterra), dandolhes a aparência de serem ‘universais’ e, deste modo, permitindo 
a todos ganhar no jogo e vencer na vida pelo seu próprio esforço. 
Do positivismo, absorveu, com muita propriedade, sua concepção 
de homem como ser puramente biológico e orgânico, ser que é 
determinado por caracteres genéticos e hereditários, que precisa ser 
‘adestrado’, ‘disciplinado’. Um ser que se avalia pelo que resiste. 
(Idem, p. 62)
Após ganhar espaço em nosso país a partir das décadas de 20 e 
30, a Educação Física Competitivista se consolida nas décadas de 60 e 70. 
Nesse sentido,
 O sustentáculo ideológico dessa concepção é a própria ideologia 
disseminada pela tecnoburocracia militar e civil que chegou ao poder 
em março de 1964. A ideologia do ‘desenvolvimento com segurança’, 
produzida e divulgada na Escola Superior de Guerra - ESG -, deu 
o tom principal para a idéia de uma tecnização da Educação e da 
Educação Física no sentido de uma racionalização despolitizadora (...), 
capaz de aumentar o rendimento educacional do país e, na área da 
Educação Física, promover o desporto representativo capaz de trazer 
medalhas olímpicas para o país. (GHIRALDELLI: 1991, p. 30).
A Psico-pedagogização vem a ser outra tendência da Educação 
Física em nosso país, pautada no ‘reducionismo psico-pedagógico’. Ela se 
caracteriza pela
[...] análise das instituições sociais - a Escola, por exemplo - enquanto 
‘sistemas fechados’, forjando formulações abstratas, a-históricas de 
criança’, ‘Homem’, ‘idoso’, como que se existissem ‘em si mesmos’, 
ao largo das influências das relações sociais de produção que se 
fazem presentes na sociedade em que se encontram inseridos,[...]. 
(CASTELLANI: 1991, p. 219)
O autor esclarece que foi exatamente por meio das políticas 
educacionais, implementadas no decorrer das décadas de 60 e 70 do século 
passado, que o reducionismo psico-pedagógico foi enfatizado, respondendo, 
na Educação Física, às imposições decorrentes da Teoria do Capital Humano. 
Podemos perceber, portanto, que esse período foi o auge do predomínio das 
concepções pedagógicas de cunho ‘tecnicista’. Tais concepções primam pelo 
caráter fomentador de formação acrítica, tão - somente centrada na busca da 
capacitação técnico-profissionalizante, originária de mão-de-obra qualificada. 
Tendo como base o movimento escolanovista, a Educação Física 
Pedagogicista passa a ganhar dimensão maior no período posterior à 
Segunda Guerra Mundial, mais precisamente entre 45 e 64, quando ocorre 
o desenvolvimento industrial com intensidade maior, acompanhado de 
crescente urbanização e, em conseqüência, aumento da rede de ensino, fruto 
da política dos governos dessa época. 
A característica desta ideologia era a manutenção do amortecimento 
e o mascaramento da luta de classes e, como resultante, não se propunha 
desenvolver um projeto educacional comprometido com o homem concreto, 
ou seja:
 [...] para o homem inserido no contexto real de uma sociedade 
enodoada pelos conflitos classistas. A Educação Física Pedagogicista, 
envolvida por esse pensamento, vai dirigir seu discurso para a entidade 
humana abstrata, deslocando a Educação Física para a tarefa de 
‘promover o homem’ como ser genérico e incapaz de sustentar 
divergências com seus semelhantes.(idem 1991, p.41)
Há o germe de outra tendência a ser assumida politicamente e 
implementada pelos governos que se seguiram, após o golpe militar. Tendo 
em vista que a concepção predominante no Brasil, antes do golpe - o 
desporto-espetáculo e o desporto de alto-nível - é aquela que, encarando a 
Educação Física como algo deveras acima das lutas políticas, 
[...] vai reclamar da sociedade a necessidade de encarar a educação 
Física não somente como uma prática capaz de promover saúde ou de 
disciplinar a juventude, mas de encarar a Educação Física como uma 
prática eminentemente educativa. E, mais que isto, ela vai advogar a 
‘educação do movimento’ como a única forma capaz de promover a 
chamada ‘educação integral’. (CASTELLANI: 1991, p.19)
Durante aproximadamente duas décadas, o Brasil esteve sob um 
regime político autoritário - a chamada Ditadura Militar - que procurou 
impor seu projeto educacional apoiado pelos acordos MEC/USAID, tendo 
como princípios a racionalidade, a eficiência e a produtividade, de cunho 
economicista. O expoente máximo dessa época é o americano Frederick 
Winslow Taylor.
Por ser método pautado na racionalidade da produção fabril, o 
taylorismo possibilitava uma produtividade maior pela supressão dos gestos 
e comportamentos considerados supérfluos, assim como economia de tempo 
controlada pelo crivo dos cronometristas.
Na perspectiva de Rago & Moreira (1994), o taylorismo consistia em 
nisso:
Método de racionalizar a produção, logo de possibilitar o aumento da 
produtividade do trabalho ‘economizando tempo’, suprimindo gestos 
desnecessários e comportamentos supérfluos no interior do processo 
produtivo, o sistema Taylor aperfeiçoou a divisão social do trabalho 
introduzida pelo sistema de fábrica, assegurando definitivamente o 
controle do tempo do trabalhador pela classe dominante.[...] este 
método de intensificação da produção em um menor espaço de 
tempo acabou por penetrar e determinar até mesmo atividades que se 
realizam fora dos muros da fábrica. (Rago & Moreira: 1994, p. 10)
Importa salientar que a obtenção do rendimento máximo pode ser 
verificada em diversas instâncias de nossa sociedade. Tanto nos esportes 
quanto, até mesmo nas atividades domésticas, a busca por tal rendimento, 
muitas vezes, extrapola os limites ditados por instruções que versam a 
respeito da forma de ação das pessoas, de como elas podem expressar seus 
sentimentos e pensamentos. 
A importância do taylorismo, a nosso ver, advém fundamentalmente do 
fato de concretizar de forma exemplar a noção do ‘tempo útil’ que a 
sociedade do trabalho introjetou no coração de cada um de nós: há 
muito tempo guardamos um relógio moral que nos pressiona contra 
o ócio. E muito embora o registro do tempo já não pertença hoje às 
classes abastadas, quem entre nós ainda ouve o canto do galo? (Rago 
& Moreira: 1994, p. 10) 
 Assim, Taylor denuncia sua visão de mundo e de homem, ao 
fazer um paralelo entre os homens comuns e os que tinham um vigor físico 
maior da seguinte forma: 
 [...] de 75 carregadores apenas cerca de um homem em oito era 
fisicamente capaz de manejar 47,5 toneladas por dia [...]. Ora, o único 
homem capaz desse serviço não era em sentido algum superior aos 
demais que trabalhavam na turma. Aconteceu apenas que ele era o 
tipo boi - espécime que não é raro na humanidade, nem tão difícil de 
encontrar que seja demasiado caro. Pelo contrário, era um homem tão 
imbecil que não se prestava à maioria dos tipos de trabalho. (TAYLOR, 
apud RAGO & MOREIRA: 1994, p. 20)
A preocupação do autor com os homens era direcionada ao aumento 
da produção fabril, e com isso, os indivíduos eram concebidos como 
apêndices das máquinas, ou, simplesmente, objetos auxiliares da produção 
industrial. 
O taylorismo foi consolidado nos Estados Unidos no decorrer da 1a. 
Guerra Mundial quando a classe trabalhadora diminuiu sua resistência ao 
patriotismo por que era movida, e passou a conviver com a organização 
“científica” do trabalho nas fábricas de material bélico.
Na Europa, os operários lutaram contra o estabelecimento dos 
princípios tayloristas desde o final do século XIX. Porém, foi durante o nazifascismo que ocorreu uma radicalização quanto à utilização das idéias de 
Taylor e, na Rússia, Lênin se utilizou delas por entender que representavam o 
que de mais avançado havia no capitalismo.
A Educação Física brasileira, por sofrer influências fortes das 
concepções de cunho conservador, carregadas de valores formais e 
hierárquicos, é implantada. Com a entrada em vigor da Lei n 5.692/71, da 
Lei nº 5.540/68 e do Decreto n 69.450/71, suas características identificamna com os pressupostos tayloristas, visto que:
• Cabe aos alunos o papel de desenvolvimento das capacidades, no 
sentido produtivo e eficiente;
• Os instrumentos e técnicas passaram a ter papel relevante na relação 
pedagógica;
• As supervisoras e coordenadoras impõem as formas de planejamento 
mais adequadas, submetendo professoras e alunas a elas;
• As pesquisas que enfocam aspectos biomecânicos são estimuladas 
sob a ótica da neutralidade científica;
• Começam a surgir os laboratórios de Educação Física nas 
universidades;
• Ocorre proliferação de faculdades de Educação Física e, também, 
associações de professores, objetivando unicamente conquistas 
corporativas e altamente ligadas aos interesses dominantes;
• A Educação Física passa a ser encarada como útil socialmente, 
desvinculada das lutas políticas dos demais setores da sociedade. 
No Regime Militar, sustentada por um aparato legal, a Educação 
Física passou a ser obrigatória (juntamente com a disciplina Educação Moral 
e Cívica) em todos os níveis de ensino e, considerando “desporto de alto 
nível” como referência foi direcionada para a busca incessante do “talento 
esportivo”, em detrimento do enorme contingente de pessoas excluídas de 
sua prática, contendo, assim, os pressupostos do taylorismo.
Giroux (1992), ao discutir a direção em que a prática pedagógica 
de cunho tecnicista tem encaminhado os trabalhos dos professores e das 
professoras, alerta para o fato de que
[...] o exercício do magistério vem sendo crescentemente subordinado 
à divisão técnica e social do trabalho, o que, ou amarra o professor 
aos ditames de especialistas que foram removidos do contexto da sala 
de aula, ou serve para aumentar a distância política entre aqueles que 
controlam a escola e aqueles que trabalham no dia-a-dia, de fato, com 
os estudantes e com os currículos. No primeiro caso, os professores são 
relegados a tarefas instrumentais que deixam pouco ou nenhum espaço 
para o discurso e as práticas sociais de oposição. A pedagogia, 
assim, é reduzida à implementação de taxionomias que subordinam 
o conhecimento a formas de reificação metodológica, enquanto as 
teorias de ensino tornam-se cada vez mais técnicas e padronizadas, 
no interesse da eficiência, do gerenciamento e do controle de formas 
limitadas de conhecimento. (GIROUX: 1992, p. 9)
A denúncia deste autor é pertinente, pois mostra a mudança, por essa 
ótica, do papel da professora como elemento de interferência crítica, com os 
alunos, na produção do conhecimento, tendo em vista que
[...] a tendência de reduzir o professor ao nível de um escriturário, que 
executa ordens de outros dentro da burocracia escolar, ou ao nível de 
um técnico especializado, é parte de um problema maior dentro das 
sociedades ocidentais: um problema marcado pela divisão continuada 
do trabalho social e intelectual e pela crescente tendência opressiva 
para o gerenciamento e a administração da vida diária.(GIROUX: 
1992, p. 10)
Nas aulas de Educação Física, s alunos, por vezes, são submetidos a 
um trabalho de ordenamento de movimentos específicos. Se tais movimentos 
são considerados requisitos prévios para que tenham suas habilidades 
desenvolvidas até atingir as tarefas consideradas, pelas professoras, o as 
mais complexas, os alunos acabam por ter acesso parcial ao conhecimento e, 
como resultante, têm entendimento fragmentado e desconexo do assunto. 
Gramsci (1989), ao analisar o processo de fragmentação a que 
eram submetidos os homens em seus lugares de trabalho, mostra-nos a 
importância de continuarmos alimentando nossas utopias, e a necessidade 
de fortalecermos nossa caminhada para superar os valores discriminatórios 
preconizados por Taylor. Dessa maneira, o autor assim enfatiza :
Quando o processo de adaptação se completou, verifica-se então que 
o cérebro do operário, em vez de mumificar-se, alcançou um estado 
de liberdade completa. Só o gesto físico mecanizou-se inteiramente; 
a memória do ofício, reduzido a gestos simples repetidos em ritmo 
intenso, ‘aninhou-se’ nos feixes musculares e nervosos e deixou o 
cérebro livre para outras ocupações. Da mesma forma que se caminha 
sem necessidade de refletir sobre todos os movimentos necessários para 
mover sincronizadamente todas as partes do corpo, assim ocorreu e 
continuará a ocorrer na indústria em relação aos gestos fundamentais 
do trabalho; caminha-se automaticamente e, ao mesmo tempo, pode-se 
pensar em tudo aquilo que se deseja. (GRAMSCI: 1989, p. 404)
Percebemos a denúncia da existência de que as idéias de 
simplificação, determinação, previsibilidade, e irreversibilidade são rejeitadas 
pela motricidade humana, em oposição ao acolhimento das idéias do 
caos, de imprevisibilidade e de incerteza. Nessa perspectiva, observamos 
que, do ponto de vista da motricidade humana e por considerar sua 
singularidade, não poderíamos jamais nos referir a pernas que correm, 
mas a pessoas correndo. Até porque, quem corre não é a perna ou o pé, 
mas um ser humano concreto, que corre em determinado local, movido por 
seus interesses, necessidades e de acordo com suas motivações, sob certas 
condições climáticas, estando inserido e influenciado por sua cultura, em certo 
momento histórico de sua existência humana.
Portanto, por considerar tais características inerentes aos homens e 
mulheres, concordamos com Freire ao apontar que
Não é apenas um pé a chutar uma bola, mas um sujeito histórico, 
num contexto cultural específico etc. E ainda, do ponto de vista da 
motricidade humana, não poderíamos fixar nossa atenção simplesmente 
no sujeito que chuta, muito menos apenas na bola chutada. Nossa 
atenção terá que se fixar na ação de chutar, que não pertence ao 
sujeito nem à bola. Antes, é um acontecimento original, pertencente ao 
momento particular do encontro entre o sujeito motivado para chutar, 
que só existe naquele momento histórico, estaremos nos dirigindo 
simultaneamente para o sujeito e a bola. A palavra chave, nesse caso, 
é interação. Quando investigamos o fenômeno da motricidade humana, 
descrevemos a face cultural do gesto, descrevemos o visível que não 
vem desacompanhado, mas antes, traz consigo tudo aquilo que não se 
vê. (FREIRE: 1992, p. 117)
A tendência da Educação Física, que possibilita ao professor 
desenvolver um trabalho crítico que resgata os valores democráticos, tem 
como característica:
[...] uma ação essencialmente política à medida que busca possibilitar 
a apropriação, pelas Classes Populares, do saber próprio à cultura 
dominante, instrumentalizando-as para o exercício pleno de sua 
capacidade de luta no campo social. Trata-se, portanto, no concernente 
à Educação Física no Brasil, de apostar na imperiosidade de traduzir o 
acesso ao saber - produzido, sistematizado e acumulado historicamente 
- pelas Classes Subalternas, nas ‘coisas’ pertinentes à Motricidade 
Humana, através da socialização do corpo de conhecimento existente 
a respeito do conhecimento do Homem em movimento. (CASTELLANI: 
1991, p. 221)
O autor, ao assumir sua identificação com esta concepção, parte 
da idéia que a Educação Física brasileira tem o compromisso de difundir a 
compreensão do elemento básico que é o Movimento Humano, devendo 
este trabalho ir além dos limites orgânicos e biológicos. Torna-se necessário, 
portanto, que o ser humano seja compreendido como ser eminentemente 
cultural. E o seu movimento corporal estará sempre representando a cultura 
em que se encontra inserido, até porque tal movimento necessariamente 
estará sendo a expressão de toda a influência cultural em que se encontra 
inserido, assim como, de forma concomitante, ele se apresenta como 
resultado desses elementos.
Neste sentido, existe uma real necessidade de
[...] entendermos que aquilo que define a Consciência Corporal 
do Homem é a sua compreensão a respeito dos signos tatuados 
em seu corpo pelos aspectos socioculturais de momentos históricos 
determinados. É fazê-lo sabedor de que seu corpo sempre estará 
expressando o discurso hegemônico de uma época e que a 
compreensão do significado desse ‘discurso’, bem como de seus 
determinantes, é condição para que ele possa vir a participar 
do processo de construção do seu tempo e, por conseguinte, da 
elaboração dos signos a serem gravados em seu corpo. (CASTELLANI: 
1991, p.221)
Dessa forma, observamos a existência de uma tendência que vem 
se estabelecendo em prol de uma Educação Física oposta à tradicional, a 
Educação Física Popular, que vem se configurando principalmente a partir da 
década de oitenta do século XX 
[...] não se pretende disciplinadora de homens e muito menos está 
voltada para o incentivo da busca de medalhas. Ela é, antes de tudo, 
ludicidade e cooperação, e aí o desporto, a dança, a ginástica etc. 
assumem um papel de promotores da organização e mobilização dos 
trabalhadores [...].(GHIRALDELLI, 1991:21)
Com isso, a Educação Física assume papel político voltado a favor 
da educação da classe economicamente menos favorecida. Os aspectos 
ligados à ludicidade tendem a ser mais valorizados e privilegiados, assim 
como temas ligados à solidariedade, à organização da classe trabalhadora 
o de respectiva mobilização voltada para a tarefa de construção de uma 
sociedade efetivamente democrática, tornando -se aspectos existentes dentro 
do contexto das professoras. 
As discussões a respeito da cultura corporal fazem parte do momento 
contemporâneo em que a luta pela conquista dos direitos humanos se 
encontra presente nos mais variados espaços sociais organizados e em 
construção. Nessa perspectiva, as concepções a respeito da corporeidade 
estão registradas nos Parâmetros Curriculares Nacionais, documento este que 
aponta para o fato de o ser humano sempre ter produzido cultura e que sua 
produção faz parte de todo o processo histórico, tendo em vista que tudo o 
que é produzido está, necessariamente, inserido num determinado contexto 
cultural, e por estar nesse contexto, toda cultura produzida e reproduzida 
encontra-se diretamente influenciada pelo contexto no qual se encontra 
inserida. 
Portanto, ao fazer referência à cultura, o documento aponta para este 
fato:
É preciso considerar que não se trata, aqui, do sentido mais usual 
do termo cultura, empregado para definir certo saber, ilustração, 
refinamento de maneiras. No sentido antropológico do termo, afirma se que todo e qualquer indivíduo nasce no contexto de uma cultura, 
não existe homem sem cultura, mesmo que não saiba ler, escrever e 
fazer contas. É como se pudesse dizer que o homem é biologicamente 
incompleto: não sobreviveria sozinho sem a participação das pessoas e 
do grupo que o gerou. (BRASIL: 1997, p. 23)
Tendo em vista que o ser humano é um ser inacabado, e por entender 
que o entorno social exerce forte influência no indivíduo, assim se entende 
cultura: 
[...] é um conjunto de códigos simbólicos reconhecíveis pelo grupo: 
neles o indivíduo é formado desde o momento da sua concepção; 
nesses mesmos códigos, durante a sua infância, aprende os valores do 
grupo; por eles é mais tarde introduzido nas obrigações da vida adulta, 
da maneira como cada grupo as concede. (idem, p. 23)
 Assim, os múltiplos conhecimentos que foram produzidos e são 
socialmente usufruídos, tendo como base os aspectos corporais e os 
movimentos desenvolvidos pelos homens e mulheres, são contemplados pela 
área do conhecimento denominada Educação Física, sendo considerados 
fundamentais às atividades culturais do movimento que têm, como finalidade, 
o lazer, a expressão dos diversos sentimentos, os afetos e as emoções, 
assim como as possibilidades existentes de manutenção, de recuperação e, 
também, de promoção das mais diversas atividades que visem à promoção 
da saúde, tanto individual como de toda coletividade. 
Dessa forma, a construção da identidade e da autonomia da criança 
necessita estar vinculada ao estabelecimento de vínculos com as outras 
crianças e com os adultos para que possa se reconhecer e compreender suas 
diferenças com relação aos demais e, assim, conseguir desenvolver recursos 
pessoais, objetivando vivenciar diferentes situações com sucesso.
A capacidade de socialização passa por um processo de 
amadurecimento na infância, à medida que são disponibilizadas para 
as crianças, oportunidades de interação com os outros, a utilização e 
conseqüente experimentação das regras sociais produzidas por meio dos 
contatos no cotidiano e em suas atividades lúdicas, até porque:
A fantasia e a imaginação são elementos fundamentais para que 
a criança aprenda mais sobre a relação entre as pessoas, sobre o 
eu e sobre o outro. / No faz-de-conta as crianças aprendem a agir 
em função da imagem de uma pessoa, de uma personagem, de 
um objeto e de situações que não estão imediatamente presentes e 
perceptíveis para elas no momento e que evocam emoções, sentimentos 
e significados vivenciados em outras circunstâncias. Brincar funciona 
como um cenário no qual as crianças se tornam capazes não só de 
imitar a vida como também de transformá-la. (BRASIL: 1998, vol.2, 
p.22) 
Percebemos, portanto, uma crescente valorização que as atividades 
lúdico-corporais vêm conquistando, ao se reconhecer que o brincar contribui 
para a interiorização de determinados valores sociais, no âmbito dos 
mais diversos grupos sociais, constituindo, portanto, importante espaço de 
desenvolvimento das potencialidades da criança. 
Ao refletirmos a respeito das concepções que permeiam o trabalho 
tanto das professoras de Educação Física quanto das outras professoras, 
que por motivos diversos desenvolvem atividades lúdico-corporais com as 
crianças, passamos a ter uma compreensão melhor da possibilidade de 
surgimento de outras concepções que aflorarão, no decorrer dos tempos, por 
um processo de aprimoramento e superação das tradicionais, e, certamente, 
apontarão para outras possibilidades de compreensão da corporeidade 
humana, que se instala e necessita ser devidamente desenvolvida a partir da 
infância.
O que importa, para quem pretenda atuar como professora, é 
saber situar-se histórica e epistemologicamente diante da diversidade de 
concepções e, também, de suas ideologias, tendo em vista a construção 
de uma perspectiva de trabalho que melhor responda às necessidades 
educacionais singulares das crianças, e às suas pretensões profissionais e 
pessoais. 

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